O poder de “O quarto poder”

Durante uma breve conversa sobre o filme “O quarto poder”, uma colega confessou que este filme veio fazê-la desistir de vez da carreira de jornalista, já que ela se encontra em crise com relação ao curso. Realmente, para quem não anda satisfeito com o jornalismo, a película citada não ajuda muito. Pelo contrário! “O quarto poder” é um filme que derruba a imagem glamurosa do jornalismo e desilude a maior parte dos jovens estudantes que sonham transformar o mundo como porta-vozes do povo. Se há algo que pode ser apontado como negativo neste filme, talvez seja a idéia de que ele é um “destruidor de sonhos”. Mas sinceramente, a meu ver, esta obra é perfeita!
Acredito que a história do repórter Max Brackett (Dustin Hoffman) e o guarda Sam Balley (John Travolta), se nos fosse contada em livros, não nos ensinaria tanto quanto através do cinema. Com um roteiro excelente, cada plano é uma “fala” a parte. As primeiras cenas do filme nos fazem imaginar, por um breve momento, que estamos assistindo a uma trama policial. O olhar de Dustin Hoffman, seguido de uma câmera subjetiva a observar o Banco Federal, nos faz pensar que uma armadilha está sendo preparada. Seria um assalto? Em um plano detalhe, achamos que uma arma está sendo montada. Hoffman observa se seus companheiros, escondidos em pontos estratégicos, estão prontos. Estes, assim como ele, montam seus equipamentos que mais parecem armas. A câmera subjetiva nos mostra através de uma janela, o movimento dentro do prédio. Após a passagem de um carro da polícia, descobrimos que Hoffman é um repórter. Ele vê que seu “alvo” está saindo do banco, dá o sinal a sua equipe e juntos partem para o ataque.
Enfim, já nos primeiros minutos do filme se vê o jornalista como uma espécie de predador que para conseguir a matéria desejada, reúne o seu bando (equipe), arma-se até os dentes com microfones, câmeras, luz, tripés, ou seja, tudo aquilo que desorienta e enfraquece a “vítima” (sabemos o quanto uma câmera pode assustar algumas pessoas). E como um felino, o repórter observa sua presa e escolhe o momento certo para atacá-la. Até aí, é divertido para os sonhadores se imaginarem como estes seres destemidos.
A cena seguinte mostra Max Brackett na redação da empresa em que trabalha, querendo dar continuidade a uma matéria baseada em suposições: “Ele roubou dinheiro de velhinhos, Lou!”, tenta convencer seu superior, que rebate: “Esqueça o caso e pronto!”. Primeiro choque para nossos jovens estudantes, a maior e mais cruel realidade de sua profissão. A cena até poderia ser congelada e surgir uma voz em off dizendo: “Se você pensa que um dia vai sair por aí fazendo justiça com textos ou um microfone na mão, ESQUEÇA!!! Antes de você, há uma empresa onde o que realmente importa sãos os interesses dela e não os seus ideais!” . E daí, se ouviria uma risadinha macabra e o filme voltaria a se desenrolar.
Humor negro a parte, o grande foco de “O quarto poder” é a ética. Max transforma um acontecimento, a principio pequeno, em um verdadeiro espetáculo, buscando benefício próprio. No desenrolar da trama, percebemos o enorme poder que a mídia exerce sobre as pessoas e como um jornalista ciente desse poder pode transformar uma formiga em um elefante.
Comecemos observando que Max é um repórter de tv, o que favorece o sensacionalismo. Afinal, “imagem é tudo”! Pelo menos é o que dizem. E realmente, imagem diz mais que mil palavras, ainda que suspeitemos de sua veracidade, visto que hoje em dia podemos construir o que quisermos usando programas de edição de imagem como Photoshop, Adobe Premiere, Final Cut. Resumindo: podemos “fazer o cão”! E não é a toa que já exista um programa chamado Inferno.
Tendo a fábrica de sonhos ao seu lado, Max vai reconstruir a imagem de Sam, tornando-o o mocinho da história. De fato ele não é um vilão, mas suas ações o comprometem bastante. Na verdade, Sam é uma vítima da mídia desde o princípio. Primeiro, porque só teve a trágica idéia de ir armado até o museu - e chamo de trágica, porque olhando a situação sob a ótica da Poética de Aristóteles, esse ato de Sam é um erro trágico, ou seja, uma ação que resulta em algo imerecido, no caso, sua morte - , porque viu na televisão que as pessoas sempre ouvem aqueles que agem como ele está agindo. Depois o entendemos como vítima, porque Sam é usado por Brackett que deseja ter uma grande matéria, manipulando o outro como uma marionete. Percebendo que Sam é influenciável, Max tira proveito. Até o discurso do suposto seqüestrador é transformado como mostra a cena em que Sam diz: “Diga a ele que estou irritado!”, e Max repete: “Ele está muito irritado!”. Com isso, acontece uma nova produção de sentido da situação. E por fim, Sam é vítima da rivalidade dos dois jornalistas, Max e Kevin.
Sam é apenas um recorte para mostrar a vulnerabilidade da sociedade em relação à mídia. Quando Max apresenta as pessoas a Sam como a opinião pública, acrescentando que esta é uma força poderosa e mais na frente diz que a mesma é volúvel, entendemos que a opinião pública é uma força poderosa nas mãos da mídia, que a usa e manipula de acordo com seus interesses.
Max repreende sua estagiária por ter ajudado o guarda Cliff, baleado por Sam. Segundo o jornalista, é preciso escolher fazer parte da história ou apenas registrá-la, mas ele mesmo se torna personagem da história que narra. Mais que isso, ele se coloca numa postura de herói, assim como mostra a cena em que ele retorna ao museu, munido de seus equipamentos e pára diante do prédio para mirar seus espectadores.
A cena em que as duas menininhas são libertadas, é muito interessante. Enquanto todos que estão fora do museu imaginam que as crianças estão assustadas, o que de fato as amedronta está fora do prédio: a mídia. Como uma manada enlouquecida, a imprensa avança para as crianças que acuadas dão passos para trás como se no fundo se sentissem mais seguras junto ao suposto vilão. Pudera! Em “O quarto poder”, não há limites para a imprensa. Repórteres se disfarçam de médicos, pagam para pessoas mentirem, sobem em andaimes, compram depoimentos, enfim, tudo é válido para esquentar a notícia que na verdade, não passa de um produto. E é aí que Max percebe que seus interesses não serão alcançados e finalmente tenta agir sem egoísmo, mas já é tarde, pois nesse momento ele cai na própria armadilha e se torna tão vítima quanto Sam. Já não existe apenas um vilão na história, já que Max é colocado como cúmplice de Sam. Max ainda se torna pior que o outro, uma vez que Sam é manipulado por aquele que deveria ser apenas portador de notícias e falar pelo povo.
Mas Max Brackett não desiste. Continua indicando como Sam deve agir: “Entregue-se! Eu serei testemunha de que foi um acidente!”, ele diz. “Quem vai acreditar em você?”, lembra Sam. Ou seja, Max perde totalmente a credibilidade até para Sam que naquele momento parece perceber que esteve ao lado de alguém pior que ele o tempo todo. A perda da credibilidade é o preço a se pagar pelo mau uso do “poder”. O reconhecimento de Max de que foi a imprensa quem causou a morte de Sam, confirma o poder que a mídia exerce sobre as pessoas, seja para o bem ou para o mal.
Pela clareza como expressa a realidade de boa parte dos jornalistas, “O quarto poder”, mais que um filme, é uma prova de que a prática é bem diferente da teoria. E para aqueles que preferem o sensacionalismo e querem crescer às custas das emoções alheias, este filme é um verdadeiro manual. Porém, é válido lembrar que a brilhante atuação de Dustin Hoffman tanto em “O quarto poder” quanto em “Mera coincidência”, deixa claro que agir como “um criador de ilusões”, pode não acabar bem.
Acredito que a história do repórter Max Brackett (Dustin Hoffman) e o guarda Sam Balley (John Travolta), se nos fosse contada em livros, não nos ensinaria tanto quanto através do cinema. Com um roteiro excelente, cada plano é uma “fala” a parte. As primeiras cenas do filme nos fazem imaginar, por um breve momento, que estamos assistindo a uma trama policial. O olhar de Dustin Hoffman, seguido de uma câmera subjetiva a observar o Banco Federal, nos faz pensar que uma armadilha está sendo preparada. Seria um assalto? Em um plano detalhe, achamos que uma arma está sendo montada. Hoffman observa se seus companheiros, escondidos em pontos estratégicos, estão prontos. Estes, assim como ele, montam seus equipamentos que mais parecem armas. A câmera subjetiva nos mostra através de uma janela, o movimento dentro do prédio. Após a passagem de um carro da polícia, descobrimos que Hoffman é um repórter. Ele vê que seu “alvo” está saindo do banco, dá o sinal a sua equipe e juntos partem para o ataque.
Enfim, já nos primeiros minutos do filme se vê o jornalista como uma espécie de predador que para conseguir a matéria desejada, reúne o seu bando (equipe), arma-se até os dentes com microfones, câmeras, luz, tripés, ou seja, tudo aquilo que desorienta e enfraquece a “vítima” (sabemos o quanto uma câmera pode assustar algumas pessoas). E como um felino, o repórter observa sua presa e escolhe o momento certo para atacá-la. Até aí, é divertido para os sonhadores se imaginarem como estes seres destemidos.
A cena seguinte mostra Max Brackett na redação da empresa em que trabalha, querendo dar continuidade a uma matéria baseada em suposições: “Ele roubou dinheiro de velhinhos, Lou!”, tenta convencer seu superior, que rebate: “Esqueça o caso e pronto!”. Primeiro choque para nossos jovens estudantes, a maior e mais cruel realidade de sua profissão. A cena até poderia ser congelada e surgir uma voz em off dizendo: “Se você pensa que um dia vai sair por aí fazendo justiça com textos ou um microfone na mão, ESQUEÇA!!! Antes de você, há uma empresa onde o que realmente importa sãos os interesses dela e não os seus ideais!” . E daí, se ouviria uma risadinha macabra e o filme voltaria a se desenrolar.
Humor negro a parte, o grande foco de “O quarto poder” é a ética. Max transforma um acontecimento, a principio pequeno, em um verdadeiro espetáculo, buscando benefício próprio. No desenrolar da trama, percebemos o enorme poder que a mídia exerce sobre as pessoas e como um jornalista ciente desse poder pode transformar uma formiga em um elefante.
Comecemos observando que Max é um repórter de tv, o que favorece o sensacionalismo. Afinal, “imagem é tudo”! Pelo menos é o que dizem. E realmente, imagem diz mais que mil palavras, ainda que suspeitemos de sua veracidade, visto que hoje em dia podemos construir o que quisermos usando programas de edição de imagem como Photoshop, Adobe Premiere, Final Cut. Resumindo: podemos “fazer o cão”! E não é a toa que já exista um programa chamado Inferno.
Tendo a fábrica de sonhos ao seu lado, Max vai reconstruir a imagem de Sam, tornando-o o mocinho da história. De fato ele não é um vilão, mas suas ações o comprometem bastante. Na verdade, Sam é uma vítima da mídia desde o princípio. Primeiro, porque só teve a trágica idéia de ir armado até o museu - e chamo de trágica, porque olhando a situação sob a ótica da Poética de Aristóteles, esse ato de Sam é um erro trágico, ou seja, uma ação que resulta em algo imerecido, no caso, sua morte - , porque viu na televisão que as pessoas sempre ouvem aqueles que agem como ele está agindo. Depois o entendemos como vítima, porque Sam é usado por Brackett que deseja ter uma grande matéria, manipulando o outro como uma marionete. Percebendo que Sam é influenciável, Max tira proveito. Até o discurso do suposto seqüestrador é transformado como mostra a cena em que Sam diz: “Diga a ele que estou irritado!”, e Max repete: “Ele está muito irritado!”. Com isso, acontece uma nova produção de sentido da situação. E por fim, Sam é vítima da rivalidade dos dois jornalistas, Max e Kevin.
Sam é apenas um recorte para mostrar a vulnerabilidade da sociedade em relação à mídia. Quando Max apresenta as pessoas a Sam como a opinião pública, acrescentando que esta é uma força poderosa e mais na frente diz que a mesma é volúvel, entendemos que a opinião pública é uma força poderosa nas mãos da mídia, que a usa e manipula de acordo com seus interesses.
Max repreende sua estagiária por ter ajudado o guarda Cliff, baleado por Sam. Segundo o jornalista, é preciso escolher fazer parte da história ou apenas registrá-la, mas ele mesmo se torna personagem da história que narra. Mais que isso, ele se coloca numa postura de herói, assim como mostra a cena em que ele retorna ao museu, munido de seus equipamentos e pára diante do prédio para mirar seus espectadores.
A cena em que as duas menininhas são libertadas, é muito interessante. Enquanto todos que estão fora do museu imaginam que as crianças estão assustadas, o que de fato as amedronta está fora do prédio: a mídia. Como uma manada enlouquecida, a imprensa avança para as crianças que acuadas dão passos para trás como se no fundo se sentissem mais seguras junto ao suposto vilão. Pudera! Em “O quarto poder”, não há limites para a imprensa. Repórteres se disfarçam de médicos, pagam para pessoas mentirem, sobem em andaimes, compram depoimentos, enfim, tudo é válido para esquentar a notícia que na verdade, não passa de um produto. E é aí que Max percebe que seus interesses não serão alcançados e finalmente tenta agir sem egoísmo, mas já é tarde, pois nesse momento ele cai na própria armadilha e se torna tão vítima quanto Sam. Já não existe apenas um vilão na história, já que Max é colocado como cúmplice de Sam. Max ainda se torna pior que o outro, uma vez que Sam é manipulado por aquele que deveria ser apenas portador de notícias e falar pelo povo.
Mas Max Brackett não desiste. Continua indicando como Sam deve agir: “Entregue-se! Eu serei testemunha de que foi um acidente!”, ele diz. “Quem vai acreditar em você?”, lembra Sam. Ou seja, Max perde totalmente a credibilidade até para Sam que naquele momento parece perceber que esteve ao lado de alguém pior que ele o tempo todo. A perda da credibilidade é o preço a se pagar pelo mau uso do “poder”. O reconhecimento de Max de que foi a imprensa quem causou a morte de Sam, confirma o poder que a mídia exerce sobre as pessoas, seja para o bem ou para o mal.
Pela clareza como expressa a realidade de boa parte dos jornalistas, “O quarto poder”, mais que um filme, é uma prova de que a prática é bem diferente da teoria. E para aqueles que preferem o sensacionalismo e querem crescer às custas das emoções alheias, este filme é um verdadeiro manual. Porém, é válido lembrar que a brilhante atuação de Dustin Hoffman tanto em “O quarto poder” quanto em “Mera coincidência”, deixa claro que agir como “um criador de ilusões”, pode não acabar bem.
OBS: Essa resenha foi produzida para a disciplina de TREPJ (Técnicas de Reportagem, Entrevista e Pesquisa em Jornalismo), ministrada pela Profª Suely Maux do Curso de Comunicação Social - Jornalismo da UFPB.
Comentários
Postar um comentário
Olá! Muito obrigada pela sua visita.