Dia dos pais

Ninguém fala com ele. E quando fala, não diz o que ele espera ouvir. Às vezes, nem o olham.

Sente-se vazio. Sente-se humilhado. Sente-se um idiota por ter derramado tantas gotas de suor para alimentar aquelas bocas que se recusam a abrir e dizer-lhe palavras de carinho, no dia dedicado aos iguais a ele.

Por que o tratavam assim? Por que o desprezavam? Por que nem sequer o percebiam?

O que fez para merecer isso? Ou melhor, o que não fez?

É seu dia! Dia dos pais! Ninguém vê?

Sua vontade é gritar: “SOU O PAI DE VOCÊS!!! OLHEM-ME! RESPEITEM-ME!”

Mas o grito morre em sua garganta: “me amem…”

Mesmo que gritasse, ninguém escutaria. Porque ninguém quer escutá-lo há muito tempo.

Olha ao redor! Parece que se esconderam. Não há ninguém. O que ele vê são adultos, em cujas faces ele não reconhece suas crianças.

“Para onde elas foram?” – ele se pergunta.

E mais uma vez, se refugia na rua, pois não se sente em casa.

Saiu sem perceber que cada um dos filhos, sentia-se ferido por dentro. Suas almas tinham sido golpeadas por aquele homem em quem já não reconheciam o próprio pai.

Esperavam abraçá-lo, beijá-lo, mostrar que apesar de todas as dores, ainda havia respeito, amor. Mas não puderam chegar perto. Pois aquele homem fugiu logo cedo, antes que a casa acordasse.

Quando voltou, o homem os olhava através de uma redoma. Isolara-se, como vinha fazendo em todas as datas comemorativas.

Viram quando ele saiu novamente. Preferia estar na rua.

Por que agia assim? Por que os desprezava? Por que não se orgulhava dos bons filhos que eram? Por que não os ouvia?

Por que queria sempre estar longe deles?

Acreditavam que o pai tinha construído um muro ao redor de si, impedindo que os filhos chegassem perto. E por terem tanto respeito a ele, ficavam quietos do lado de fora. Não imaginavam, porém, que o desejo daquele homem era ter este muro derrubado. Este mesmo muro que ele acreditava que tinham construído para mantê-lo distante.

Horas depois, ele retorna. Tudo continua igual. Mal percebem sua volta.

Na verdade, percebem. Só que preferiram calar. Melhor pensar que é um dia comum, assim não sofrem com a idéia de ter o Dia dos Pais, destruído por ele mesmo: o pai!

Vai para o quarto. Deita-se. Fecha os olhos e pensa: “Deveria ter sido um dia como qualquer outro. Mas não! Foi o pior de todos…”

Em pouco tempo, adormece e enche a casa com o som de seu roncar. Então, um de seus filhos o mira dormindo e percebe que mais uma vez o pai tinha se refugiado. Mas dessa vez, refugiara-se nas lembranças de um passado muito distante e feliz, que só retornava através de sonhos…

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O que a gente tem de ser...

De volta ao antigo lar

Dívida bem paga!